ACTUAL Nº 1583 01 Março 2003 Inês volta a Coimbra A ópera «Inês de Castro», de Giuseppe Persiani, que terá lugar em Coimbra, no Páteo das Escolas da Universidade, nos dias 6 e 7 de Junho, promete vir a ser uma superprodução. Texto
de Katya Delimbeuf Foi
em trajes de época, na simbólica Quinta das Lágrimas, que se
apresentou a ópera Inês de Castro, de Giuseppe Persiani, a
realizar em Coimbra em 6 e 7 de Junho próximo, no Páteo das Escolas da
Universidade. Os guardas postados à entrada não esmoreceram perante a
chuva, como os dois cavaleiros que, de cada lado da entrada, aguardavam
os convidados. Os carros substituíram os coches, e foram chegando,
guiados pela luz das velas que iluminavam a escadaria, e pelo som da música
medieval, que embalava o ar e os sentidos. Lá dentro, esperava-nos um
pequeno aperitivo. Boris
Martinovic e Niksa Radovanovic (o barítono D. Afonso IV e o tenor D.
Pedro), e Dora Rodrigues (D. Elvira, Dama da Corte), abriram o apetite
do público presente cantando alguns trechos da ópera. Quanto à linda
Inês - personagem pouco habitual no repertório operático -, a escolha
recaiu sobre a búlgara Svetla Martinovich, soprano reconhecida também
pela sua beleza. A direcção musical foi entregue ao maestro José
Ferreira Lobo que, além da orquestra, dirige os cantores Lia Altavilla
(D. Branca, Infanta de Castela), Dora Rodrigues, Carlos Guilherme (D.
Gonçalo, Grande do Reino) e José Oliveira Lopes (D. Rodrigo, Capitão
da Guarda). Nas
palavras do produtor-executivo, António Mendes, a ópera em três actos
de Giuseppe Persiani, sobre libreto de Salvatore Cammarano, «foi
escolhida pela sua beleza», mas pretende também chamar a atenção
para a importância do «fenómeno Inês de Castro» a nível
internacional. «Existem cerca de 30 óperas e cantatas sobre esta
figura da nossa História e isso é desconhecido da maioria das pessoas.
Em 1999, a cidade italiana de Jesi, que tem grande tradição operática,
escolheu justamente esta ópera para comemorar o bicentenário do
nascimento de Persiani.» Para a ocasião, contou com a ajuda da
professora Paola Ciarlantini que foi responsável pela recuperação do
espólio musicológico - que bisa agora na consultoria artística da
produção. Há
165 anos que Inês de Castro não era apresentada em Portugal, desde o
sucesso que alcançou a 10 de Dezembro de 1838, no Teatro de S. Carlos.
Santina Ferlotti encarnava o papel de Inês, Giovanni Paganini o de D.
Pedro e Filippo Coletti dava corpo e voz a D. Afonso IV. «Esta vai ser
a primeira vez que se representa esta ópera na cidade onde decorreu a
acção», realça a musicóloga. Carlos
Avilez, que é o responsável pela encenação, considera este espectáculo
«o maior desafio» da sua carreira. «O trabalho de que nós gostamos
mais é sempre o próximo. É-se sempre mais exigente», diz. Para a
primeira ópera que dirige a ser representada ao ar livre, Avilez
promete: «Não será um espectáculo convencional. Vai ter uma
componente plástica muito forte. Posso dizer, por exemplo, que a
personagem de D. Pedro vai ser acompanhada por cães quando entrar em
cena, para dar expressão a uma faceta mais animalesca. Além disso,
tenciono basear um pouco a encenação nas crónicas de Fernão Lopes e
posso adiantar também que o início vai ser um trecho de Os Lusíadas». Esta
versão da Inês de Castro pretende distinguir-se pela escala da sua
produção. «É um espectáculo que vai movimentar muita gente - mais
de cem músicos, cantores e figurantes, em cena - é uma encenação 'semi-stage',
diferente de um palco de ópera normal», esclarece o produtor.
Diferente é também o local escolhido. Quem conhece o páteo da
Universidade com a sua majestosa escadaria e famosa torre sineira que os
estudantes tornaram conhecida por «cabra» percebe que o espectáculo
ali encenado pode ser surpreendente. Aliás, uma das mais-valias desta
ópera passa «por aproveitar uma belíssima praça do nosso país, o
que, para além de inédito, tem ainda uma enorme carga histórica». Quanto
à acústica - provavelmente um dos elementos mais difíceis de
controlar, podendo chegar a comprometer a qualidade da exibição ao ar
livre -, António Mendes assegura um trunfo de peso: a «marca» de
Jerry Eade, no seu dizer, «o melhor engenheiro de som do mundo».
Ficamos à espera que Inês nos encante. |
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A Quinta das Lágrimas serviu de cenário à apresentação da ópera |